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Historiadores analisam a importância do primeiro Parlamento brasileiro, instalado há 200 anos

Ilustração/Notices of Brazil in 1828 and 1829 Interior da Cadeia Velha, que abrigou a Constituinte de 1823 e onde funcionou posteriormente a Câma...

02/05/2023 às 10h40
Por: Correio Fonte: Agência Câmara de Notícias
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Interior da Cadeia Velha, que abrigou a Constituinte de 1823 e onde funcionou posteriormente a Câmara dos Deputados - (Foto: Ilustração/Notices of Brazil in 1828 and 1829)
Interior da Cadeia Velha, que abrigou a Constituinte de 1823 e onde funcionou posteriormente a Câmara dos Deputados - (Foto: Ilustração/Notices of Brazil in 1828 and 1829)

A Assembleia Constituinte de 1823 foi o primeiro Parlamento formado no Brasil. O objetivo era redigir a primeira Constituição do país, que havia se tornado independente de Portugal no ano anterior e permanecia como regime imperial. A Assembleia não conseguiu cumprir esse objetivo, porque foi dissolvida seis meses depois por d. Pedro I, mas deixou uma grande contribuição para a construção do Estado brasileiro. A data da sua instalação (3 de maio) deu origem ao Dia do Parlamento.

Período de revoluções
O período entre o final do século 18 e o começo do século 19 é um dos momentos mais revolucionários da história humana. Foi um período de revoluções tecnológicas e também das ideias políticas. Dentro dessa perspectiva de mudança, havia uma transformação política radical em andamento: a inversão da chamada pirâmide de poder. Quem explica é o escritor e jornalista Laurentino Gomes, autor da trilogia de livros históricos “1808”, “1822” e “1889”.

“Até então, prevalecia a ideia de que todo poder emanava do rei e em seu nome era exercido. Aí surge essa ideia completamente revolucionária, ela vem da Grécia antiga, mas nunca tinha sido colocada em prática em países de grande território. Essa ideia de que todo poder emana do povo e que era necessário eleger representantes do povo para através de um parlamento fazer leis”, disse.

Laurentino Gomes e sua trilogia
Laurentino Gomes e sua trilogia - (Foto: Divulgação)

Grandes mudanças começaram com a independência norte-americana, em 1776, que cria a primeira democracia representativa no mundo. Depois, a Revolução Francesa de 1789. E essas ideias aos poucos vão contaminando o resto do mundo e chegam a Portugal e ao Brasil, afirma Laurentino Gomes.

“É isso que coloca em movimento um vendaval político que acabaria provocando a revolução liberal do Porto, a convocação das Cortes Constituintes em Portugal. Essa ideia de que o rei deveria se submeter a uma Constituição, de que o rei não estaria acima de tudo e de todos, e que para fazer uma Constituição é preciso ter representantes eleitos. A primeira eleição brasileira de fato para eleger representantes foi o envio da delegação para as Cortes constituintes de Lisboa de 1821”.

Não deu certo. As cortes radicalizaram. Queriam reconduzir o Brasil à condição de colônia, e os representantes brasileiros vieram embora. Mas o Brasil já estava contaminado com essas ideias. Havia vários grupos que pressionavam d. Pedro a também abrir mão de parte de seus poderes e aceitar ser orientado em muitas de suas decisões por representantes eleitos pelo povo.

Nasce o Parlamento brasileiro
Nasce nesse contexto o Parlamento brasileiro. Quem explica é a historiadora e pesquisadora Isabel Lustosa, autora dos livros “Insultos impressos” e “D. Pedro I”.

Isabel Lustosa:
Isabel Lustosa: " Se não tinha bens, não tinha direitos de cidadão - (Foto: Arquivo pessoal)

“Já havia uma participação de representantes do Brasil nas Cortes de Lisboa. Agora, a formação de uma assembleia exclusivamente brasileira, com deputados de várias partes do Brasil, só acontece pela primeira vez no país na Constituinte de 1823. É esse o modelo que os portugueses adotam, quando fazem sua revolução. Os brasileiros, quando se rebelam contra as medidas que essa Constituinte portuguesa está tomando em relação ao Brasil, pedem a d. Pedro, ainda príncipe regente, que convoque eleições para uma Constituinte brasileira que represente os interesses dos brasileiros”, disse ela.

A convocação foi em 3 de junho de 1822. A Assembleia Geral, Constituinte e Legislativa do Império do Brasil foi instalada em 3 de maio de 1823, no Rio de Janeiro. Mais de um século depois, essa data deu origem ao Dia do Parlamento, estabelecido pela Lei 6.230, de 1975.

Sistema elitista
A ideia de povo governando a si próprio, o povo como poder constituinte, difere da que temos hoje. Os tempos são outros. Hoje se tem a ideia de voto universal, todas as pessoas têm o direito de se manifestar politicamente pelo voto. Na época, era um voto absolutamente elitista. Até o final do século 19, para ser eleitor no Brasil, ou mesmo nos Estados Unidos, precisava ser grande proprietário e do sexo masculino. Um grupo muito restrito de pessoas escolhia os integrantes do parlamento. O voto censitário, que atendia a critérios econômicos, era a prática no mundo. No Brasil, quase assumiu um caráter inusitado, por adotar a mandioca como medida de riqueza.

É o que informa Isabel Lustosa: “A ideia da propriedade fazendo parte da cidadania era um princípio praticamente universal. Se não tinha bens, não tinha direitos de cidadão. O que acontece na 'constituinte da mandioca' era a tentativa de achar um meio de medir essas posses. A forma como o relator Antônio Carlos Andrada sugere na Constituição seria a quantidade de farinha, que era um produto alimentício importante da dieta do brasileiro, que se produzia. Um tanto folclórico.”

São vários os conflitos e divergências que desaguaram na primeira Constituinte brasileira entre grupos que se opunham dentro da própria sociedade, apontam os pesquisadores. O Brasil, na época da independência, estava dividido entre monarquistas absolutos, monarquistas liberais e republicanos. Era uma grande divisão, a respeito de como organizar e governar o Brasil independente. Cada grupo tinha suas próprias ideias sobre como limitar o poder do imperador.

Em 1º de setembro de 1823, o relator apresenta sua proposta para a primeira Constituição brasileira.

Isabel Lustosa lembra que os debates na Assembleia passam a envolver também a questão portuguesa. Há um acirramento do sentimento anti-lusitano que vai marcar todo o primeiro reinado, incluindo confrontos. Muitos passam a ver o imperador, que havia declarado a independência, agora como defensor dos interesses portugueses.

Alguns discursos de d. Pedro desagradaram parte dos parlamentares, e a assembleia tomou um ar um pouco agressivo em relação ao imperador. Para Lustosa, essa soma de fatores está por trás da crise entre Parlamento e o imperador, que levará à dissolução da primeira Constituinte brasileira.

Escravidão
Posição diferente tem o pesquisador Laurentino Gomes. Para ele, a principal razão para a dissolução da constituinte teria sido a questão da escravidão, pois uma emenda parlamentar seria apresentada nesse sentido.

“O José Bonifácio, o homem forte de d. Pedro, era um homem que tinha ideias bastante avançadas a respeito do Brasil. Ele iria propor à Assembleia Constituinte um projeto que acabava com o tráfico negreiro e aos poucos com a própria escravidão no longo prazo. E foi este o problema. O Brasil era o país mais escravista da América. Estava viciado em escravidão. A lavoura dependia de trabalho cativo. Os homens mais poderosos na Assembleia Constituinte eram senhores de escravos, a aristocracia rural. Isso fez com que a Constituinte desabasse”, afirmou.

Além da questão da escravidão, Laurentino destaca que iniciativas de camadas mais humildes da população brasileira, que perceberam na Constituinte uma possibilidade de obter mudanças que assustaram a elite nacional:

“Há registros curiosos de pessoas no interior do Brasil que passaram a mandar documentos de reivindicações para a assembleia constituinte tratando de questões, às vezes muito locais. As pessoas perceberam que havia uma mudança e havia um novo poder ao qual podiam recorrer. Claro que a elite escravista brasileira percebeu imediatamente que seria muito mais fácil manter o status quo, acabando com a Constituinte, mantendo o poder no imperador. E é um pacto que surge entre a aristocracia rural e escravista e o trono brasileiro. Um apoia o outro, um não mexe nos interesses do outro. Esse pacto continua até o final do Império.”

D. Pedro I e a dissolução da Assembleia Constituinte
Foto: Reprodução

Em 11 novembro de 1823, diante dos atritos com o imperador, surgem informações de que a Assembleia será fechada. Alguns deputados decidiram ficar em assembleia permanente, atravessando a madrugada em trabalhos para impedir o fechamento. O episódio ficou conhecido na história como a Noite da Agonia. No dia 12, por volta das 13h, d. Pedro mandou uma tropa fechar a Assembleia. Os Andrada são expulsos do Brasil, junto com outros políticos e jornalistas.

Chegava ao fim a primeira experiência de parlamento brasileiro. Mas sua importância seria destacada mais tarde como a primeira organização de uma representação nacional, como afirma Isabel Lustosa.

“O Afonso Arinos de Mello Franco, em num livro sobre constitucionalismo, vai falar disso. Aquilo era a representação do Brasil. Pela primeira vez, brasileiros de várias partes, uma elite, pessoas ilustradas e alguns radicais, se reuniam em uma assembleia. E isso dava concretude à ideia de um Brasil continental. Tinha políticos de Pernambuco, do Rio Grande do Sul, de Minas, reunidos na capital. Esse papel da assembleia é muito importante nesse sentido. Ele é a consolidação da ideia de que o Brasil era formado por todas aquelas províncias. Apesar de o Norte conflagrado pela guerra não ter mandado representantes.”

Primeira Constituição
No ano seguinte, 1824, D. Pedro iria impor a primeira Constituição do país. Uma Constituição ao mesmo tempo liberal e com viés autoritário, já que trazia o Poder Moderador, um tipo quarto poder exercido pelo imperador para um certo “controle” sobre o Legislativo e o Judiciário.

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